Recentemente
tivemos uma palestra em nossa escola sobre o tema da homosexualidade,
promovida pela Associação Russana da Diversidade Humana e pela
Secretaria Estadual de Políticas públicas para o público LGBTT
(Gays, Lésbicas, Bissexuais, Travestis e Transexuais). A palestra
aconteceu por ocasião da realização da quarta parada regional pela
diversidade humana. Evidentemente, é um tema e um evento que causam
muitas reações e debates polêmicos nos diversos espaços da
sociedade. Em todo lugar é assim, de um lado o público LGBTT e
simpatizantes das causas trazidas pelo movimento e do outro lado os
opositores, defensores de uma moral que vê a homossexualidade como
um erro ou um mal. Essa oposição dialética existe porque,
aparentemente, há sempre no meio das polêmicas dois discursos
opostos que tentam se afirmar como verdadeiros. É preciso, no
entanto, entender e separar bem esses dois discursos implícitos nas
polêmicas que giram em torno do tema da homossexualidade, para, a
partir daí, perceber que são duas formas de compreensão e
discursos que não podem e não devem ser "misturados"...
Fundamentalmente,
diria que há um discurso CIVIL e outro MORAL. O discurso moral nos
faz olhar para a homossexualidade do ponto de vista do certo ou do
errado. Já o discurso civil nos impele a olhar o tema a partir do
ponto de vista dos direitos. Como eles se misturam e se contrapõem a
ponto de gerar tantas divisões e, em alguns casos, a ponto de causar
tantas agressões? Aprofundemos, como exemplo, a polêmica questão
do, erroneamente chamado, "casamento gay"...
O ser
humano é naturalmente lançado para a relação interpessoal, seja
lá de que forma essa relação se manifeste. Aristóteles já dizia que
o homem (antropos) é naturalmente político, naturalmente
social e sociável. Historicamente, a necessidade de sociabilidade
foi sendo cultural e diversamente construída. E não foi diferente
no âmbito da cultura ocidental em que vivemos e habitamos,
profundamente marcada pelo cristianismo e, consequentemente, por seu
ethos (conjunto de valores morais). É por isso que a
compreensão de união construída na cultura ocidental está
fundamentada sob o conceito de "casamento", elaborado pela
moral judaico cristã. E enquanto instituição moral judaico cristã
o casamento é uma expressão de união fundamentalmente
heterossexual. Exatamente por isso, particularmente, penso que o
chamado "casamento gay" é incoerente e desrespeitoso com
os próprios homossexuais...
Porém,
há um outro aspecto da expressão humana de união que, na proposta
desta reflexão, parece apontar para além da compreensão
moral, que é o de união civil. Nesta, qualquer cidadão ou cidadã
ao se unir com um outro ou outra garante para si determinados
direitos civis, como a partilha de bens, entre outros... E é a
partir desta compreensão civil de união que o público homossexual
reivindica para si o direito de união. Porém, como foi dito, essa
dialética compreensão nem sempre é tão claramente distinta,
principalmente porque a própria compreensão de direito civil está
fundamentada na compreensão de direito natural, onde o ser humano é
considerado natural e biologicamente homem e mulher, e o debate se
aprofunda mais, porque toca na própria essência da compreensão do
conceito de "humano"...
O que
é ser "humano"? É possível uma resposta que não reduza
o ser humano a apenas um aspecto, seja ele biológico, social, moral
ou religioso? Mais ainda: é possível uma resposta que não implique
confusamente os diversos aspectos? Acreditamos que sim, principalmente
se reconhecermos que cada aspecto tem seu limite, exatamente porque o
que parece definir essencialmente o ser humano é mais do que o que o reduz
ao puramente biológico, social, moral ou religioso... Porque, no fim
das contas, somos mais do que aquilo que tenta nos definir.
Voltemos
a questão da homossexualidade. Para além das definições
biológica, social, religiosa e moralmente construídas a pessoa com
orientação homossexual sempre estará para além daquilo que tente
a definir, exatamente porque, antes de ser homossexual, ela é
humana. A afirmação moral religiosa que está por trás da
argumentação de que a homossexualidade é biologicamente errada e
incoerente, é tanto limitada quanto a afirmação de que a
homossexualidade é natural ou biologicamente adquirida. As duas
concepções tem seus limites (porque são reducionistas) e esses
devem ser reconhecidos quando se dispõe a refletir, dialogar e
debater sobre o assunto... Foi o que parece ter feito o Papa
Francisco, líder espiritual da maior instituição religiosa/moral
do mundo, ao afirmar que a Igreja não deve "interferir
espiritualmente" na vida das pessoas de orientação
homossexual. Ele reconheceu que, apesar de moralmente contra, a
Igreja deve assumir seu limite e, assumindo seu limite, ser o que
define sua essência: testemunhar e anunciar o amor a toda pessoa
humana.
Particularmente,
como cristão, é exatamente isso que penso e nisso que acredito.
Tenho muitos amigos e conhecidos de orientação homossexual. Penso
que não preciso concordar com suas orientações para amá-los. O
que posso fazer é reconhecer meu limite em compreender profundamente
as razões das diversas manifestações de sua humanidade. E, mesmo
assim... e, talvez por isso mesmo, acolher o misterioso sentido da
existência da vida humana que é maior do que nós mesmos.
José Wilson Correa Garcia é blogueiro e educador.
Perfeitas colocações meu amigo, como lembro nas palavras do sábio Chico Xavier em um dos seus discursos no programa Pinga Fogo que faz o cidadão refletir sobre questionar se deve interferir ou ditar o que é a felicidade de um outro ser. Focando que o que importa é o verdadeiro amor pelo outro, independente de pele ou escolha.
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