O
tempo da vida, passa. Mas o tempo do amor não é o mesmo. Quando você partiu, a
memória de um passado guardado no coração era como um presente que nunca
terminava. E assim continua sendo. Eu sei que você não gosta que soframos, mas é
inevitável, pois o tempo da saudade também é diferente. Ele não passa, assim
como a dor da sua partida que para nós é perda, aí no céu é conquista. Você
sabe que a gente é meio paranoico pra essa questão do tempo. Lembra que você
nunca gostava de se atrasar pra nada? Nem de se adiantar... Pois é. Fico
imaginando você agoniado aí no céu, com vontade de correr atrás de uma bola pra
lá e pra cá. Deve ser difícil se contentar em apenas voar... É estranho, quando
a gente tá aqui na terra sonha em voar. Quando está aí no céu, como você, sonha
em sentir o chão. Diga pra Deus dar um jeito nisso. Eu sei que podemos fazer
daqui, mas prefiro que você faça daí, sem pressa, porque não há tempo com que
se preocupar ou se perder.
Não
sei se você lembra, mas a gente marca o tempo aqui na terra. Hoje faz 11 meses
que você se transformou em anjo. O local onde te plantamos está verdinho, lindo
de se ver. Celeste, mesmo escondido, sempre está por lá. Ela, assim como eu,
estamos aprendendo a olhar praquele chão com cuidado e amor. Virgínia e papai,
não foram ainda, talvez com medo, por causa da dor, de não conseguirem ver a
vida que cresce. Mas sei que eles irão.
Como
deve ter visto, Celeste levou mamãe. Ela sofreu, mesmo que a gente não consiga
entender a extensão do sofrimento dela. No dia, ela se debruçou sobre o chão
onde te plantamos e tentava falar contigo, como se fala com uma criança. Acho
que, dentre todos nós, mamãe é a que mais, misteriosa e dolorosamente, vive o
mistério da sua partida sem se apegar ao tempo. Para ela você continua sendo o
bebezinho, o Xandinho dela. Espero que contar isso não te chateie ou te faça
sofrer. Apesar de compreender que você sabe, uso como último recurso as
palavras, porque sei que através delas você consegue sentir os pensamentos e compreender
os sentimentos mais profundos de cada um que as lê, mesmo com nossos limites
humanos. Por isso, acolha como um desabafo.
Uma
coisa me chamou atenção, as rosas que crescem lá estão lindas. Fiquei pensando
que o tempo delas é determinado pelo tempo do sol, assim como seu tempo aí em
cima é determinado pelo tempo de Deus. Elas estão lindas porque descobriram que
a vida delas só tem sentido se se nutrem do chão onde estão plantadas da mesma
forma como se abrem pra receber a luz que irradia do sol. É curioso como a
gente também tem aprendido a conservar a memória do tempo que passamos juntos aqui
no chão da nossa história como alimento pra vida, assim como sua chegada aí em
cima se tornou motivo pra se nutrir com as coisas do céu. Seja aqui ou aí, você
continua sendo alimento para todos nós.
Há rosas abertas e há rosas
ainda escondidas dentro de um botão que, a seu tempo, se abrirá para contemplar
o infinito mistério da vida. Seu tempo, meu irmão, se mistura ao tempo de cada
uma dessas rosas, que somos nós. Você que está aí, mais perto de Deus do que
nós, abrace-nos sempre com suas recordações e não se esqueça de que, aqui,
continuamos nutrindo nossas vidas com o melhor que de ti ficou...